segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Mais uma patriotada americana


O novo filme do grande Clint Eastwood chega mergulhado em muita polêmica, "Sniper Americano" é a história real de Chris Kyle (Bradley Cooper), um atirador de elite que é considerado o responsável pela morte de nada menos do que 160 inimigos, durante a Guerra do Iraque.

E fica difícil de enfrentar o filme, sem um certo horror que perdura por toda a sua exibição. O Chris que Bradley Cooper mostra na tela pode até posar de herói, mas padece daquela mentalidade que hoje explica muita coisa de ruim que continua acontecendo no mundo; onde os americanos, em nome de uma guerra ao terrorismo, atacam quem bem entendem sempre com muita truculência, sem qualquer preocupação com direitos humanos.

Basta dizer que Chris refere-se aos muitos inimigos, que dizima pelas ruas de cidades iraquianas, como "selvagens". Com uma atitude racista, para dizer o mínimo, ele não hesita em atirar em mulheres e crianças para cumprir sua missão de proteger os soldados americanos envolvidos nas ações.

O diretor Clint Eastwood tenta redimir Kyle de culpa mostrando o personagem como vítima de um sistema de pensamento que herdou do pai, cowboy durão, que exige que seus filhos assumam a atitude do "cão pastor" e nunca das "ovelhas" ou dos "lobos".

A interpretação de Bradley Cooper, mais "bombado" do que nunca, tem aquela expressão que nos acostumamos a ver em grandalhões descerebrados como Silvester Stallone e Arnold Schwarzenegger, mas ainda tem a seu favor uma finíssima, quase invisível camada de verniz, especialmente nos momentos em que ele aparece tão deslocado, fora de combate, sentindo-se um estranho em sua própria casa. Nada que chegue a justificar sua indicação ao Oscar, que no entanto, me pareceu muito mais uma atitude política/mercadológica feita em favor de um filme que tem conseguido levar muita gente aos cinemas.

Além disso, com todo o rigor técnico de grande produção que o filme recebeu, especialmente nas cenas de ação, onde merece destaque um combate travado em meio a uma enorme tempestade de areia que mistura soldados e inimigos, chega a ser imperdoável que uma simples cena, em que Bradley está em casa, ajudando a cuidar de sua filha recém nascida, o truque de usar uma boneca no lugar de um bebê de verdade, consiga causar risos não intencionais na plateia.

Algo que não se espera ver nem em filme independente, com elenco desconhecido, rodado quase sem orçamento, o que dirá em uma super produção indicada a nada menos do que 6 Oscars.

Confira o trailer de "American Sniper": 








A busca da natureza para redenção


Mais uma surpreendente história da vida real que vai parar nos cinemas, "Livre" tem seu roteiro baseado na autobiografia de Cheryl Strayed (Reese Witherspoon), entitulada "Wild: From Lost To Found On The Pacific Crest Trail".

O projeto do filme é uma aposta da própria Reese Witherspoon, que, descontente com os papeis que vinha recebendo como proposta dos grandes estúdios e produtoras, decidiu criar sua própria produtora.

A adaptação do roteiro ficou nas mãos do prestigiado escritor Nick Hornby que optou por idas e vindas no tempo para mostrar o que levou uma mulher comum, recém divorciada e sem qualquer preparo físico ou experiência prévia, a colocar uma mochila maior do que ela nas costas e enfrentar as 1100 milhas de caminho entre desertos e montanhas da chamada "Pacific Crest Trail", uma trilha para ser feita a pé que segue próxima da costa oeste dos EUA, e corta o país de ponta a ponta, indo da fronteira com o México até a fronteira com o Canadá.

Nem é preciso dizer que os cenários atravessados por Cheryl são pura beleza natural, mas o desconforto físico que ela parece estar enfrentando por quase todo o tempo não parece deixar a vista de desertos e montanhas assim, tão atraente assim aos olhos do público.

Além de captar a beleza e os perigos do caminho, o diretor Jean-Marc Vallee mostra todo o horror da vida pregressa de Cheryl como se filmasse um pesadelo, em contraste com o cenário de sonho da trilha.

Aí, merece destaque a interação entre Reese Witherspoon e Laura Dern, que interpreta Bobbi, a mãe de Cheryl, talvez a responsável pela maior de suas feridas e também a mais difícil de curar.

A caminhada solitária pela maior parte do tempo, também traz novos personagens para a vida de Cheryl e com eles ela parece aprender cada vez mais.

"Livre" é um daqueles filmes que ajudam a revelar o quanto realmente estamos desconectados da natureza e o quanto um contato real com ela pode ser a cura para todos os nossos males.

Assista ao trailer de "Livre":


sábado, 21 de fevereiro de 2015

Um amor no meio de um drama


Mais uma cinebiografia que chega aos nossos cinemas, "A Teoria de Tudo" mostra a vida complicada de um dos mais brilhantes cientistas da história mais recente da humanidade, o físico Stephen Hawking. O filme é baseado no livro "Travelling to Infinity: My Life with Stephen" de Jane Wilde Hawking e talvez por isso tenha um maior enfoque no romance entre o cientista vivido por Eddie Redmayne e Jane (Felicity Jones), na época em que já trabalhava na tese que apresentaria para obter o seu PHD.

Como físico, a maior ambição de Stephen é a de encontrar uma teoria que explique a existência do Universo. Brilhante, Stephen conhece Jane em uma das festas da Universidade, mas não demora muito a começar a sentir os efeitos da Esclerose Lateral Amiotrófica, uma doença degenerativa progressiva, que aos poucos vai paralisando todos os músculos do corpo.

O médico que o diagnostica é bem claro e diz a Hawking que ele tem apenas uns dois anos de vida, por isso ele decide acelerar tudo, seu casamento com Jane e seu trabalho de pesquisa.

O trabalho de Eddie Redmayne é primoroso e acompanhamos de perto cada uma das dificuldades que vão aparecendo na vida pessoal de Hawking, enquanto sua mente continua tão brilhante quanto antes, seu corpo parece que aos poucos vai desistindo da vida. Em comparação com Redmayne, o trabalho de Felicity Jones parece bem mais simples, embora seja bastante eficiente, ela ainda dá ao seu personagem toda a carga da mulher que, por amor, enfrenta cada uma das dificuldades com uma enorme resignação.

O filme não se aprofunda muito nas dificuldades do cientista para vencer suas condições físicas e continuar trabalhando e apenas sugere um conflito entre seu ateísmo e a religiosidade de Jane. O diretor James Marsh parece ter optado por um olhar mais distante dos conflitos, tentando mostrar um drama humano um pouco menos terrível do que a realidade parece sugerir.

Confira o trailer de "A Teoria de Tudo":


Boyhood - O triunfo de uma ideia genial


Não é todo dia que vemos um filme como "Boyhood" chegando aos cinemas, sei que quase ninguém sabe disso, mas filmar qualquer coisa para cinema é, antes de tudo, um trabalho complicado, por mais simples que o resultado final possa parecer na tela.

Agora imagina como é escolher um elenco de atores e filmar durante 12 anos seguidos, algumas poucas cenas por ano, porque teve a ideia de acompanhar a evolução de seus personagens durante uma parte importante da vida deles, a infância.

A ideia que Richard Linklater tinha na cabeça e conseguiu realizar, resultou em um filme encantador. E a identificação do público com o pequeno Mason (Ellar Coltrane) e sua família é imediata.

Desde as primeiras cenas em que ele é apenas um garotinho fofo, discutindo com sua mãe Olivia (Patricia Arquette) e brigando constantemente com a irmã Samantha (Lorelei Linklater), enquanto espera pelas raras visitas do pai também chamado Mason (Ethan Hawke); o espectador sente-se atraído e curioso para conhecer o destino daquela família.

E vamos acompanhando tudo de perto, não só os momentos especiais, mas principalmente o dia-a-dia, com as crianças crescendo diante dos nossos olhos, transformando-se em adolescentes e mais tarde em adultos.

Parece tudo muito simples e por isso mesmo é genial. Boyhood não é só um filme sobre a infância e o crescimento de um ser humano, mas transcende isso.
E Richard Linklater continua sendo um especialista nisso, colocar na tela e mostrar aos seres humanos do público das salas de cinema, como é a experiência de viver.

É muito bom que a recente temporada de premiações de cinema esteja dando a Boyhood uma visibilidade maior. Depois de levar para casa os principais prêmios do Globo de Ouro, melhor filme, diretor e atriz coadjuvante para Patrícia Arquette, o filme recebeu 6 indicações ao Oscar e está sendo considerado por muitos críticos um dos favoritos para arrebatar os principais prêmios da noite.

Assista ao trailer de Boyhood - Da Infância a Juventude




sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Minhas apostas para o Oscar 2015


Não está nada fácil, até mesmo os especialistas em cinema andam reticentes e está difícil encontrar quem crave palpites certeiros sobre quem sairá vencedor nesta disputadíssima edição do Oscar que acontece no domingo, dia 22/02, no tradicional Teatro Dolby, em Los Angeles.

A explicação para isso está na própria temporada de premiações, que neste ano não revelou nenhum nome como mais forte, entre aqueles que também foram indicados ao Oscar, nenhum filme saiu arrebatando todos os prêmios, mas sim, aconteceu uma pulverização e prêmios importantes como o Globo do Ouro e BAFTA, como também os das diversas entidades e sindicatos oficiais que reúnem diretores, roteiristas, atores e produtores, cada um indicou um nome diferente e, sendo assim, fica muito difícil tentar adivinhar quem serão os grandes vencedores da noite.

Mesmo assim, já vi uma boa parte dos filmes, não todos porque as distribuidoras brasileiras continuam trabalhando com a mesma "velocidade" de sempre e ainda não estrearam filmes importantes como "Para Sempre Alice" e "Vício Inerente"; sem falar em curta metragens, documentários, animações e outras categorias que nunca, ou quase nunca,  chegam por aqui.

E antes de chegar às previsões propriamente ditas, vale lembrar que os filmes que receberam mais indicações neste ano são: "Birdman ou (A inesperada virtude da ignorância)" e "O grande hotel Budapeste", candidatos a 9 estatuetas cada um e a seguir vêm  "O jogo da imitação", com oito,  "Boyhood: Da infância à juventude" e  "Sniper Americano", com seis;  "Whiplash", "Foxcatcher",  "A Teoria de Tudo" e "Interestelar" têm cinco; "Mr Turner" tem quatro indicações, "Caminhos da Floresta" e "Invencível" têm três nomeações.

Em tempo.... lá vai uma previsão minha para o Oscar 2015, que acerto em quase todos os anos: Mais uma vez, desrespeitando completamente o público, a Rede Globo deixará os brasileiros que gostam de cinema na mão.

Embora esteja anunciando a transmissão do evento, já sabemos que ela não acontecerá na íntegra, como o público brasileiro merece e deveria exigir, mas entrará no ar somente às 23:45hrs, após sua enfadonha e duvidosa programação normal terminar e isso inclui o lixo chamado BBB e outras aberrações, que, no entanto, são facilmente encurtadas, quando a emissora tem o interesse de transmitir de verdade algum evento e não simplesmente pegar a exclusividade na rede aberta apenas para impedir que alguém mais capaz transmita tudo.

Enfim, não se espante se assistir novamente à mesma demonstração de incompetência de sempre, quando os comentaristas da emissora, com a habitual cara de pau, entram no ar ainda dizendo que "não aconteceu nada de interessante" na festa, até aquele momento, para em seguida, depois de um interminável intervalo comercial, dizer que mostrarão a escolha de Melhor Filme, que todos sabem, encerra a cerimônia.

É... aquele coro que se ouve nas ruas, há anos, durante manifestações populares não poderia estar mais certo e  também se aplica à transmissão do maior evento do Cinema Mundial: "O povo não é bobo, FORA REDE GLOBO!"


Melhor filme
Birdman

Melhor diretor
Richard Linklater - Boyhood: Da infância à juventude

Melhor ator
Michael Keaton - Birdman

Melhor atriz
Julianne Moore - Para sempre Alice

Melhor ator coadjuvante
JK Simons - Whiplash

Melhor atriz coadjuvante
Patricia Arquette - Boyhood: Da infância à juventude

Melhor filme estrangeiro
Relatos Selvagens - Argentina

Melhor documentário
Citizenfour

Melhor roteiro original
O grande hotel Budapeste

Melhor roteiro adaptado
Whiplash

Melhor fotografia
Birdman

Melhor animação
Como treinar o seu dragão 2

Melhor edição
Boyhood

Melhor design de produção
O grande hotel Budapeste

Melhor figurino
O grande hotel Budapeste

Melhor maquiagem e cabelo
O grande hotel Budapeste

Melhores efeitos visuais
Interestelar

Melhor trilha sonora
O grande hotel Budapeste

Melhor canção
"Glory" de John Stephens e Lonnie Lynn - Selma

Melhor edição de som
Sniper americano

Melhor mixagem de som
Whiplash


E aí? Concordam com a minha lista? Estou esperando seus comentários....

terça-feira, 17 de fevereiro de 2015

Uma batalha pela igualdade


Um momento tão importante e decisivo da história americana finalmente chega ao cinema, para que mais pessoas consigam finalmente conhecê-lo e até compreendê-lo melhor, assistindo ao filme "Selma", com sua fantástica reconstituição de um dos períodos mais complicados e efervescentes que os Estados Unidos e o próprio mundo viveram.

No início dos anos 60, os EUA fervem com movimentos que lutam pelos direitos civis dos negros, ainda pressionados pela legislação e atitude racista de muitos estados.

E entre os líderes deste movimento, o reverendo Martin Luther King Jr (David Oyelewo) já tinha alcançado projeção mundial em 1964, ao receber o Prêmio Nobel da Paz, mas continuava em sua luta, agora tentando fazer com que os negros conseguissem de fato o direito de votar em toda a América, sem a interferência do racismo.

Esperando por uma intervenção e ordens mais claras do Presidente Lyndon B. Johnson (Tom Wilkinson), Martin Luther King parte para o Alabama, um dos estados onde os negros enfrentavam as maiores dificuldades para registrarem-se como eleitores, e lá, convoca protestos, rechaçados com violência pela polícia.

George Wallace (Tim Roth), o governador do Alabama, é tão ou mais racista que as forças policiais que comanda e os protestos, embora sejam feitos seguindo a filosofia da não-violência de King, transformam-se em batalhas campais, com muitos mortos e feridos, além de inúmeros presos.

Uma das maiores qualidades de Selma é a de mostrar, lance a lance, o xadrez político que a ação de Luther King provoca, com uma tensão crescente que explode quando, em 1965, o movimento convoca uma marcha de 50 milhas entre as cidades de Selma e Montgomery, a capital do estado do Alabama.

O roteiro de Paul Webb escolhe ver tudo bem de perto e mostra inclusive os conflitos pessoais de King com a esposa Coretta Scott King (Carmen Ejogo), ajudando a desmistificar um pouco sua figura heroica, enquanto a direção de Ava DuVernay mostra toda a devastação criada pela brutalidade.

Ah... e vale muito a pena ficar mais um pouquinho no cinema para ver os créditos finais do filme, a música tema "Glory", interpretada por John Legend, que já levou o Globo de Ouro na categoria canção original e foi indicada ao Oscar, é mesmo uma das melhores do ano.

Um grande filme, obrigatório para quem se interessa por história e mais ainda para quem não se interessa. Quem sabe, vendo com os próprios olhos, as consequências dessa doença mental chamada preconceito, as pessoas consigam combatê-lo de uma forma ainda mais eficaz para que ele termine de vez. 

Confira o trailer de "Selma"


quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Em "O Jogo da Imitação", a história do homem que desvendou o "Enigma"

Quase todos os filmes sobre heróis que se sobressaíram em qualquer uma das guerras já travadas pela humanidade sempre têm em algum momento aquele tom de admiração, que faz você deixar a sala de cinema pensando no quanto aquele ser humano ajudou o mundo a superar um momento difícil, às vezes pagando com a vida por essa superação.

Infelizmente, junto com a admiração, este "O Jogo da Imitação", também deve despertar surpresa e revolta, a medida que nos familiarizamos com sua história completa.

Com roteiro de Graham Moore, baseado no livro "Alan Turing: The Enigma" de Andrew Hodges, o filme conta a história de Allan Turing (Benedict Cumberbatch), um matemático com trabalhos escritos sobre criptografia que é recrutado secretamente pelo governo britânico para participar de um time de cientistas com a missão de decifrar as mensagens trocadas pelos nazistas utilizando o intrincado aparelho Enigma.

Turing tem uma personalidade bem difícil de se lidar, a ponto de preferir trabalhar sozinho a ter que explicar aos colegas os detalhes de sua invenção; um aparelho que possa "desembaralhar" o código que torna as comunicações entre os nazistas em algo ilegível.

Caro e intrincado, o tal aparelho que Turing inventa demora a apresentar resultados, o que faz com que o Comandante Denniston (Charles Dance), chefe da operação, passe a perseguí-lo e chega a tornar-se quase um inimigo do cientista, que precisa lutar muito para continuar as pesquisas que transformaram sua máquina, que no filme é chamado de "Christopher", em um dos precursores do computador.

E entre as muitas dificuldades que Turing enfrenta, algumas sequer fazem qualquer sentido hoje em dia, como o fato da pessoa que mais poderia colaborar no desenvolvimento de sua máquina ser uma mulher solteira, Joan Clarke (Keira Knightley muito bem no papel), que não consegue afastar-se dos pais, para trabalhar em uma equipe formada por homens, em atividades que devem permanecer secretas.

Infelizmente, o sucesso de Allan em sua empreitada não garantiu a ele o reconhecimento merecido, pelo contrário, sua descoberta foi mantida em segredo e, mais tarde, na década de 50, ele se vê preso e condenado pela justiça por ser homossexual.

Vale ressaltar que o trabalho de ator de Benedict Cumberbatch é impressionante e mesmo quando o próprio roteiro não colabora, nas sequências mais repetitivas em que ele não faz muito mais do que reclamarque ninguém o entende, ele consegue bons resultados.

O filme marca a estreia do diretor norueguês Morten Tyldum no cinema britânico e chamou atenção nesta temporada de premiações, embora ainda não tenha conseguido levar para casa nenhum prêmio ainda; de qualquer forma foram 5 indicações ao Globo de Ouro, 9 ao BAFTA, a premiação mais importante do cinema britânico, e mais 8 indicações ao Oscar.

Confira o trailer de "O Jogo da Imitação"